A lesbofobia e o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica

O dia 29 de agosto é o dia Nacional da Visibilidade Lésbica. A existência dessa data pode parecer redundante ou exagerada para algumas pessoas, pela já existência de outras datas direcionadas  à comunidade LGBTQIA+. Para quem vive a lesbianidade em seu cotidiano, porém, é mais fácil entender porquê é uma pauta cara e necessária e o quanto ainda precisamos avançar. Você está familiarizade com a data? Conhece pautas do movimento lésbico? A seguir vamos entender melhor os motivos pelos quais as lésbicas tem reivindicado visibilidade e algumas consequências do seu silenciamento. 

O que é lesbofobia e qual seu impacto?

A lesbofobia é a descriminação sofrida por mulheres lésbicas. Ela se difere da homofobia, uma vez que a lesbofobia não apenas carrega em si o preconceito contra a orientação sexual, como também uma alta dose de machismo. É sempre necessário lembrar que estamos falando sobre a relação entre mulheres, a sexualidade e o comportamento feminino que não tem por foco a figura do homem. 

 

A partir dessa definição, violências comuns enfrentadas por mulheres lésbicas (e sáficas) são:

  • Fetichização, objetificação e/ou apagamento de sua sexualidade 

Você já ouviu falar que a relação entre mulheres é “mais aceita” do que a relação entre dois homens? Não é bem assim. É muito comum que, socialmente, a sexualidade da mulher esteja atrelada ao homem e controlada por diversos mecanismos da esfera pública e privada.

No caso da lesbianidade, coloca-se a sexualidade da mulher a serviço do homem através do fetiche e da objetificação. A relação entre mulheres não é imediatamente rechaçada com violência porque existe no imaginário a ideia de que ela pode satisfazer o homem. Por isso lésbicas são abordadas em públicos por homens querendo “participar” de suas trocas de afeto ou atos sexuais. 

Também existe o apagamento da sexualidade lésbica quando a relação entre mulheres é classificada como hierarquicamente inferior. Como se sem um homem não existisse a possibilidade de uma relação ou de um ato sexual. Já conheceu homens que permitem que as namoradas fiquem com outras mulheres, mas não com outros homens? Não seria uma traição porque a relação entre duas mulheres está em outra categoria, segundo essa linha de pensamento. 

Isso não é “aceitação”. Muito pelo contrário, demonstra uma enorme falta de respeito com nossas identidades e experiências. 

 

  • Negligência na área da saúde. 

Um problema muito enfrentado por mulheres lésbicas é o descaso na área da saúde. A invisibilidade das relações sexuais lésbicas faz com que não existam bons métodos para evitar DSTs, muita falta de informação a respeito dos riscos de contraí-las e um despreparo muito grande no momento de lidar com essas questões.

Em um caso pessoal, procurei uma ginecologista com o objetivo de colocar os exames em dia e, ao ser perguntada se eu já havia tido relações sexuais, eu respondi que me relacionava apenas com mulheres. Sua resposta foi: “então você não é sexualmente ativa.”

Além de ignorar minha experiência como mulher lésbica, também naquele momento entendi que seria uma ida em vão ao consultório, pois a médica não encaminharia bem o meu caso e não me daria as orientações necessárias. 

Infelizmente casos assim deixam as mulheres lésbicas desassistidas, mal informadas e com receio de procurar ginecologistas ou outros profissionais da saúde e terem suas identidades e sexualidades desconsideradas.

 

  • Agressões físicas e psicológicas

Tal qual o restante da comunidade LGBTQIA+, a lesbianidade é um “desvio” da imposição cis-heteronormativa e, assim sendo, foco das mais diversas formas de agressões físicas e psicológicas. 

Segundo o Dossiê sobre Lesbocídio no Brasil, publicação apresentada em 2018 durante a 46ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Combate à Discriminação de LGBT (CNDC/LGBT): 

  1. Ao menos 126 lésbicas foram assassinadas no país entre 2014 e 2017;
  2. Também em 2017, 71% dos crimes foram cometidos em espaço público;
  3. 43% foram vítimas de pessoas com quem tinham vínculos afetivos e/ou familiares;
  4. 83% dos crimes foram cometidos por homens.

Os dados foram obtidos através do monitoramento de redes sociais, jornais eletrônicos e outros meios de comunicação, uma vez que não há uma estatística oficial de crimes de lesbocídio no país.

 

  • Estupro corretivo

Incluídos entre as agressões citadas acima, porém merecendo destaque, os estupros corretivos se referem a violências sexuais que tem por objetivo tentar “corrigir” a sexualidade da mulher lésbica ou seu comportamento social. 

Não há dados suficientes sobre estupro corretivo no Brasil, visto que o estupro é um crime subnotificado e, quando feito, ainda não é registrado com esse agravante. Os estupros corretivos são identificados, geralmente, pois as vítimas, no momento da violência, escutam frases homofóbicas de seus algozes. 

“Comentários como ‘você vai conhecer um homem de verdade e aprender a gostar disso’ ou ‘você vai virar mulher de verdade’ estão entre essas frases. ‘São agressões com falas sempre muito violentas e ligadas à não aceitação da exposição das mulheres como lésbicas’, diz Gabriela de Souza, advogada especializada em direitos das mulheres”. (UOL, 2019)

 

É importante acrescentar que as dificuldades enfrentadas pela mulher lésbica na sociedade são ecoadas dentro da própria comunidade LGBTQIA+. Como fruto da sociedade patriarcal em que está inserida, essa comunidade “desviante” acaba dando mais destaque para homens brancos e cisgêneros, gerando uma hierarquização que não apenas não beneficia as mulheres lésbicas como silencia e negligencia suas pautas. 

 

Entendeu a importância da data?

A invisibilidade é um fator silenciador. Um grupo silenciado vive não apenas com os sofrimentos inerentes a sua condição social, como também com o descaso, a negligência e a ignorância que não permitem que os problemas sejam identificados, reconhecidos e superados. 

A existência do próprio Dia Nacional da Visibilidade Lésbica é um sinal de que as demandas desse grupo não tiveram e não tem tido o seu espaço nas lutas por igualdade. Esse é um dos motivos para que as mulheres lésbicas vejam suas pautas avançando com mais dificuldade do que outros grupos. 

Esta é uma data para lembrarmos, a nós e a todos, que estamos aqui com as nossas dores. É uma data para que tenhamos espaço para contar nossas experiências; para conscientizar a sociedade; e pautar, com ainda mais força, as mudanças que buscamos.  

Texto por: Carolina Bizzo
Arte por: Mariana Batista

 

Referências:

VASQUES, Láris. Invisibilidade lésbica: uma violência silenciosa. Fórum. 2017. Disponível em: <https://revistaforum.com.br/direitos/invisibilidade-lesbica-uma-violencia-silenciosa/#> Acesso em 13 de agosto de 2021.

BRANDALISE, Camila. Estupro corretivo: entenda o crime de violência sexual contra lésbicas. UOL. 2019. Disponível em: <https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2019/02/04/estupro-corretivo.htm> Acesso em 13 de agosto de 2021.

POR que agosto é o mês da visibilidade lésbica? Medium. 2018. Disponível em: <https://medium.com/todxs/visibilidade-lesbica-agosto-d701658d1df> Acesso em 13 de agosto de 2021.

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